Ao contrário de “resolver” problemas das contas públicas, a proposta de reforma da Previdência entregue por Bolsonaro ao Congresso representa graves danos às contas públicas:
Dano às contas públicas I: A “economia” de R$ 1 trilhão que Guedes quer fazer corresponde ao valor que deixará de ser pago sob a forma de benefícios da Previdência e Assistência Social, ou seja, deixará de chegar às mãos das pessoas que usam o valor que recebe em consumo que movimenta a economia de forma virtuosa, fazendo retornar recursos ao próprio governo, sob a forma de tributos.
Dano às contas públicas II: Na “Capitalização”, a contribuição previdenciária que atualmente é paga por empregados e empregadores deixará de chegar aos cofres públicos! Assim, em vez de melhorar as contas públicas, a Capitalização vai significar um rombo às contas públicas, o que pode ser usado no futuro como justificativa para mais perdas de direitos!
Dano às contas públicas III: O governo não apresentou o cálculo do custo de transição para o modelo de Capitalização. Em alguns países esse custo chegou a superar o valor do PIB anual! Como apreciar essa PEC sem o devido conhecimento de seus graves danos às contas públicas?
A PEC 06/2019 segue recomendações de organismos estrangeiros como o FMI e Banco Mundial, segundo os quais seria necessário fazer tal “reforma” para que a economia volte a crescer. Nada mais falso, já que a falta de crescimento da economia não decorre de um suposto excesso de investimentos sociais, mas sim, da falta deles. O desenvolvimento socioeconômico do Brasil está amarrado principalmente devido à atuação do Sistema da Dívida e danos decorrentes da política monetária do Banco Central, como antes mencionado.
A reforma da Previdência é a repetição de modelo indicado pelo BIS (Banco Central dos bancos centrais) em vários países, mas muitos deles já estão voltando atrás.
Por que o Brasil se submete a orientações contrárias aos interesses da sociedade brasileira?
A PEC 6/2019 representa graves danos também aos direitos sociais e destrói o modelo de solidariedade (no qual toda a sociedade contribui e é beneficiária de um conjunto de proteção social que vai muito além da aposentadoria), e visa entregar a nossa Previdência Social para bancos, os únicos que irão ganhar com a administração do regime de “Capitalização”.
Estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT), demonstra que dentre 30 países que enveredaram pelo caminho da capitalização, 18 já se arrependeram e voltaram atrás, devido ao elevado custo de administração, riscos do mercado e resultados negativos que prejudicaram as contas públicas, prejudicaram a classe trabalhadora e só beneficiaram bancos que receberam as contribuições, as taxas de administração, e não tiveram que se responsabilizar pelo pagamento de qualquer benefício.
Por que o governo quer impor modelo que está dando errado no mundo todo e só beneficia bancos?
A seguir, um breve resumo dos danos provocados pela PEC 06/2019:
- Fim da solidariedade: cada trabalhador(a) terá uma conta individual, na qual depositará a contribuição definida, porém, os bancos que irão administrar essas contas não terão obrigação alguma de pagar benefício futuro, que dependerá do comportamento do mercado financeiro e poderá ser ZERO, deixando a classe trabalhadora totalmente sem proteção. O governo também não dá garantia alguma a esse modelo. É cada um por si! Esse modelo foi implantado no Chile e quebrou! Aposentados idosos estão se tornando mendigos e se suicidando!
- Insustentabilidade: A arrecadação do INSS que hoje compõe as receitas da Seguridade Social deixará de ser paga por aqueles trabalhadores e trabalhadoras que optarem por esse regime de “Capitalização”, comprometendo a sustentabilidade das atuais aposentadorias.
- Incerteza total: A PEC 06/2019 desconstitucionaliza as regras gerais para futuros servidores e segurados do INSS, e prevê que tais regras serão definidas posteriormente em Lei Complementar (que exige número menor de votos para ser aprovada), e não mais na Constituição.
- Adiamento da Aposentadoria: No mínimo aos 65 para homens e 62 para as mulheres, mas a PEC está cheia de gatilhos que elevarão essa idade mínima para muito além disso.
- Exigência de mais tempo de contribuição: No mínimo 20 anos (INSS), inclusive para trabalhadores e trabalhadoras rurais, ou 25 anos (servidores públicos), mas quem não quiser perder muito ao se aposentar terá que contribuir por 40 anos!
- FIM DA APOSENTADORIA: Essa combinação de idade mínima avançada e contribuição mínima de até 40 anos significa o fim do direito à aposentadoria para aquelas pessoas mais vulneráveis, afetadas pela informalidade e pelo desemprego, e dentre estas sobressaem as mulheres.
- Regras de Transição inaceitáveis: Exigência de 35/30 anos de contribuição, e mais a Regra 86/96, que sobe até chegar a 105/100 em 2033, ou seja, a soma da idade e do tempo de contribuição do trabalhador terá que dar 105, e da mulher 100!
- Aumento da Contribuição Previdenciária: A PEC 6/2019 contém gatilhos para permitir o aumento da contribuição previdenciária do regime de servidores públicos, sem limite, o que configura confisco!
- Fim da multa do FGTS no caso de demissão.
- Fim das aposentadorias especiais para algumas categorias, como professores(as), bombeiros civis, vigilantes, entre outras que exercem atividades desgastantes e/ou de alto risco. Será exigida idade mínima de 60 anos e tempo de contribuição de 30 anos, para professores de ambos os sexos.
- Redução para míseros R$ 400,00 no benefício (BPC) aos idosos miseráveis maiores de 60 anos, chegando a um salário mínimo somente a partir dos 70 anos. Adicionalmente, para ter acesso ao benefício, não se poderá ter patrimônio superior a R$ 98 mil, ou seja, basta ter uma pequena casa para perder o benefício.
- Fim do Abono Salarial para quem ganha mais de 1 salário mínimo mensal. Com a mudança, 91,5% do total de pessoas que hoje podem receber o abono irão perder o benefício.
- Redução da Aposentadoria por incapacidade permanente para 60%. Esse percentual só será maior para aquele(a) trabalhador(a) que ficou inválido(a) que já tiver mais de 20 anos de contribuição. Nesse caso, eleva-se 2% por ano de contribuição que exceder 20 anos. O benefício somente será de 100% no caso de invalidez causada pelas atividades do trabalho.
- Redução do valor da Pensões por morte para 60%. Se houver dependentes, acrescenta-se 10% por dependente adicional. O valor será 100% somente no caso de morte causada pelas atividades do trabalho.
- Redução de até 80% no caso de benefícios acumulados: Se uma pessoa recebe uma aposentadoria e passar a receber uma pensão, por exemplo, ela terá de escolher o benefício de maior valor, e sofrer uma redução de até 80% nos demais.
- Danos extensivos a Estados e Municípios: As regras estabelecidas valem para todos os entes federados.
Por tudo isso, toda a sociedade deve participar das mobilizações e pressão sobre os parlamentares pela rejeição dessa PEC.
É preciso ter clareza de que neste momento só existem dois lados: o lado dos bancos que irão lucrar muito com essa PEC 6/2019 e o lado da Nação brasileira, que será fortemente sacrificada com essa destruição da Seguridade Social.
Maria Lúcia Fatorelli trata no Extra Classe de temas ligados à questão tributária no país. Auditora fiscal aposentada da Receita Federal, a colunista foi presidente do Sindicato Nacional da entidade e é Coordenadora Nacional da Auditoria Cidadã da Dívida desde a fundação do movimento no ano 2001, com diversos livros publicados no país e exterior. Atuou como membro da Comissão de Auditoria Integral da Dívida Pública do Equador, assessora técnica da CPI da Dívida Pública na Câmara dos Deputados e do Comitê da Verdade sobre a Dívida Pública, instituído pelo Parlamento Grego para realizar auditoria da dívida pública da Grécia.